O Cerrado, um dos maiores mosaicos vegetacionais do nosso país, encontra-se em situação de grave risco, com mais de 46% de sua vegetação original destruída.
O que torna o Cerrado, e outras savanas ao redor do mundo, ecossistemas tão únicos é essa biodiversidade específica para cada tipo de fisionomia diferente, que vão desde fitofisionomias abertas, como campos e savanas, até ambientes mais florestais como o cerradão. Essa singularidade, além de preservar diversos processos ecológicos característicos de cada tipo de vegetação, também proporcionam diversos serviços ambientais, como a manutenção dos recursos hídricos.
No cenário climático que vivemos atualmente, muitas das áreas no Cerrado que precisam estar com vegetação, como as Áreas de Preservação Permanente (APPs), já foram desmatadas e não estão em conformidade com a lei de Proteção da Vegetação Nativa de 2012.
Hoje temos conhecimento que há meio bilhão de acres de terras degradadas ao longo da América Latina onde fazendeiros, grandes e pequenos, assim como empresas de commodities, poderiam expandir seus negócios sem sacrificar os ecossistemas nativos.
Há formas de conciliar o desenvolvimento econômico, a produção agrícola com a conservação. E um dos caminhos necessários é a restauração.
A restauração ecológica vem progredindo bastante no Brasil. Entretanto, o seu foco até o momento tem sido na restauração de vegetações florestais, deixando de lado a restauração de biomas como o Cerrado.
Geralmente as espécies que são encontradas nos viveiros de mudas no Brasil, por exemplo, são espécies florestais, em sua maioria, arbóreas. E, ao contrário das florestas, as savanas possuem uma diversidade de gramíneas, arbustos e árvores esparsas de crescimento lento.
Outro desafio para a restauração do Cerrado são as gramíneas invasoras que exercem pressão no ambiente, impedindo o estabelecimento das gramíneas nativas que deveriam ocupar o estrato baixo.
O fogo, ou também a falta dele, é reconhecido como o principal fator de distúrbio nas savanas tropicais. Os distúrbios no Cerrado são muito importantes para a regulamentação de processos ecossistêmicos. A falta dessas perturbações pode causar o desaparecimento de espécies animais e vegetais. O grande mecanismo de regeneração do Cerrado é a rebrota de raízes, que possibilitam a rebrota rápida e vigorosa após impactos como o corte, o fogo ou a geada, dependendo muito menos da chuva de dispersão e germinação de sementes trazidas pelo vento ou pelos animais como os habitats de floresta. É importante considerar o manejo do fogo durante a restauração desse bioma, especialmente no adensamento de algumas vegetações, para que a biodiversidade e os processos ecológicos sejam mantidos.
Embora restaurar o Cerrado seja um novo desafio, hoje, em diversas regiões do bioma, há núcleos de pesquisa que desenvolvem técnicas aplicadas, para compreender como é o funcionamento dessa regeneração em cada tipo de vegetação. Como nada na natureza pode ser colocado em uma caixa, afinal, de peculiaridade não falta nessa savana brasileira. E a restauração está acontecendo!
A Rede de Sementes do Cerrado, a Cerrado de Pé e o Consórcio Cerrado das Águas, por exemplo, são centros de pesquisa e capacitação que detém informações fundamentais para a recomposição da vegetação nativa. Como na produção de mudas e sementes nativas do Cerrado, na articulação de cadeias produtivas, diversificação da renda, bioeconomia, geração de empregos, entre outros.
É de suma importância ampliar e fortalecer as políticas públicas, incentivos financeiros, mercados, boas práticas agropecuárias e outras medidas necessárias para a recuperação da vegetação nativa. O Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (PLANAVEG), que possui essa premissa, pretende recuperar 12 milhões de hectares no país, principalmente em APPs e Reservas Legais. E também estima que há um potencial de criação entre 112.000 e 191.000 empregos rurais diretos (por exemplo, coleta de sementes, gestão de viveiros, plantio), contribuindo para a criação de novos postos de trabalhos e redução de pobreza.
Não se pode esquecer que a restauração é um dos componentes dentro da paisagem do Cerrado. Além da restauração, como técnica, essa ciência deve criar um elo forte entre a segurança hídrica, energética, alimentar e das comunidades tradicionais, buscando uma abordagem integrada para o Cerrado.
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Referências:
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Sobre o autor: Henrique Aguiar de Oliveira, graduando em Ciências Biológicas/Bacharelado – UFU. Adora a temática de Restauração Ecológica e nos tempos livres gosta de observar plantas.
Contato: henriqueaguia.minasbio@gmail
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